A Segunda Seção do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), em conflito de competência, determinou que
cabe ao Juizado Especial Cível de Poços de Caldas (MG) julgar o processo de um
motorista de aplicativo que teve sua conta suspensa pela empresa. O colegiado
entendeu que não há relação de emprego no caso.
Na origem, o
motorista propôs ação perante o juízo estadual solicitando a reativação da sua
conta no aplicativo e o ressarcimento de danos materiais e morais. Segundo ele,
a suspensão da conta – decidida pela empresa Uber sob alegação de comportamento
irregular e mau uso do aplicativo – impediu-o de exercer sua profissão e gerou
prejuízos materiais, pois havia alugado um carro para fazer as corridas.
Ao analisar o
processo, o juízo estadual entendeu que não era competente para julgar o caso
por se tratar de relação trabalhista, e remeteu os autos para a Justiça do
Trabalho, a qual também se declarou impedida de julgar a matéria e suscitou o
conflito de competência no STJ, sob a alegação de que não ficou caracterizado o
vínculo empregatício.
Em seu voto, o
relator do conflito, ministro Moura Ribeiro, destacou que a competência ratione
materiae (em razão da matéria), em regra, é questão anterior a qualquer
juízo sobre outras espécies de competência e, sendo determinada em função da
natureza jurídica da pretensão, decorre diretamente do pedido e da causa de
pedir deduzidos em juízo.
Moura Ribeiro
ressaltou que os fundamentos de fato e de direito da causa analisada não dizem
respeito a eventual relação de emprego havida entre as partes, e sim a contrato
firmado com empresa detentora de aplicativo de celular, de cunho eminentemente
civil.
"A relação de
emprego exige os pressupostos da pessoalidade, habitualidade, subordinação e
onerosidade. Inexistente algum desses pressupostos, o trabalho caracteriza-se
como autônomo ou eventual", lembrou o magistrado.
O
relator acrescentou que a empresa de transporte que atua no mercado por
meio de aplicativo de celular é responsável por fazer a aproximação entre os
motoristas parceiros e seus clientes, os passageiros, não havendo relação
hierárquica entre as pessoas dessa relação.
"Os motoristas
de aplicativo não mantêm relação hierárquica com a empresa Uber porque seus
serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos, e não
recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício entre as
partes."
Por fim, o
magistrado salientou que as ferramentas tecnológicas disponíveis atualmente
permitiram criar uma nova modalidade de interação econômica, fazendo surgir a
economia compartilhada (sharing economy), em que a prestação de serviços por
detentores de veículos particulares é intermediada por aplicativos geridos por
empresas de tecnologia.
"O sistema de
transporte privado individual, a partir de provedores de rede de
compartilhamento, detém natureza de cunho civil. Nesse processo, os motoristas,
executores da atividade, atuam como empreendedores individuais, sem vínculo de
emprego com a empresa proprietária da plataforma", afirmou.
Leia o acórdão. Acessado em 04/09/2019.
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