Pai pagará R$ 50
mil pelo tempo que se manteve ausente física, emocional e financeiramente.
"Não tendo tido o filho o melhor, que o dinheiro lhe sirva, como puder,
para alguma melhoria."
"Um juiz não
pode obrigar um pai a amar uma filha. Mas não é só de amor que se trata quando
o tema é a dignidade humana dos filhos e a paternidade responsável. Há, entre o
abandono e o amor, o dever de cuidado. Amar é uma possibilidade; cuidar é uma
obrigação civil."
Com esta lição a 8ª
turma Cível do TJ/DF manteve condenação fixada em R$ 50 mil a um pai por
abandonar afetivamente sua filha. O colegiado acompanhou voto do ministro
Diaulas Costa Ribeiro, relator designado para o acórdão, tendo ficado vencida a
relatora Nídia Corrêa Lima. Com a decisão, o genitor terá de pagar indenização
pelo tempo que se manteve ausente física, emocional e financeiramente da vida
da descendente.
A requerente entrou
com uma ação de reparação de danos morais contra o pai com quem, segundo os
autos, só teria tido contato aos dois anos de idade e, novamente, 14 anos mais
tarde.
Condenado em 1º
grau, o pai recorreu da sentença, mas teve o recurso negado. Segundo os
julgadores, os chamados "órfãos de pais vivos" têm direito à
reparação extrapatrimonial, aquela que segue a lógica jurídica do dano moral
decorrente da morte efetiva dos pais das vítimas de ato ilícito.
O desembargador
cujo voto foi seguido por maioria observou que a mesma lógica jurídica dos pais
mortos pela morte deveria ser adotada para "órfãos de pais vivos –
abandonados voluntariamente. “Esses filhos não têm pai para ser visto. No
simbolismo psicanalítico, há um ambicídio. Esse pai suicida-se oralmente como
via para sepultar as obrigações da paternidade, ferindo de morte o filho e a
determinação constitucional da paternidade responsável."
Neste caso, o
colegiado entendeu que o dano moral é presumido, in re ipsa, ou seja, quando a
parte afetada tem sua honra, dignidade e moralidade lesada de forma objetiva e
absoluta, não havendo, portanto, necessidade de apresentação de provas que
demonstre essa ofensa sofrida.
O desembargador
relator entendeu que “não se pode exigir (...) o cumprimento da 'obrigação
natural' do amor". Por outro lado, "cuidar é uma obrigação civil".
O colegiado considerou que negligenciar esse cuidado gera dano ao direito da
personalidade do descendente. Além disso, a CF prevê, entre outras coisas, os
critérios de respeito à dignidade da pessoa humana, a obrigação da paternidade
responsável e a proteção integral do interesse da criança.
Dessa forma, o
colegiado negou provimento ao recurso do genitor e manteve a condenação em R$
50 mil reais, estipulada pelo juízo de 1ª instância. Além disso, reforçou que o
objetivo da sentença não é obrigar os pais a amarem seus filhos, mas mitigar a
falta de cuidado daqueles que têm o dever de prestá-lo.
“A indenização do
dano moral por abandono afetivo não é o preço do amor, não se trata de novação,
mas de uma transformação em que a condenação para pagar quantia certa em
dinheiro confirma a obrigação natural (moral) e a transforma em obrigação
civil, mitigando a falta do que poderia ter sido melhor: faute de pouvoir faire
mieux, fundamento da doutrina francesa sobre o dano moral. 'Não tendo tido o
filho o melhor, que o dinheiro lhe sirva, como puder, para alguma
melhoria.'"
Quanto ao valor
fixado na sentença e mantido em 2º grau, o magistrado entendeu que não é
absurdo, nem desarrazoado, nem desproporcional.
"R$ 50 mil
equivalem, no caso, a R$ 3,23 por dia e a R$ 3,23 por noite. Foram cerca de
7.749 dias e noites. Sim, quando o abandono é afetivo, a solidão dos dias não
compreende a nostalgia das noites. Mesmo que nelas se possa sonhar, as noites
podem ser piores do que os dias. Nelas, também há pesadelos."
Processo:
0015096-12.2016.8.07.0006. Acessado em 1505/2019.
Fonte: https://www.migalhas.com.br
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